domingo, 28 de outubro de 2007

O Começo

Decidi postar um conto meu hoje... =)

Sentia por dentro que aquele seria o último encontro. Estava sentada, lendo o livro que acabara de comprar, o suco de abacaxi com hortelã quase no fim, quando ele se aproximou, agigantou-se ao seu lado. De sua cadeira o avistava e pensava que o tempo deveria parar, petrificando assim o toque em seu ombro. Sentiu o sangue mais uma vez ebulir, trazendo a sensação de plenitude que tantos buscam, mas que poucos encontram. Não é preciso ser sábio para perceber o toque da plenitude, mas é preciso ser muito estúpido para jogar tudo fora e desperdiçar o que é sublime (existem mais estúpidos que sábios na face da Terra). Levantou-se, pagou o suco.


Caminharam abraçados em direção à casa dele. Os passos descompassados pela diferença de altura sempre a fizeram se esforçar mais para acompanhá-lo. Ao entrar, seus olhos percorreram a sala e pôde perceber que poucas coisas mudaram de lugar. Lembrou-se, então, do bilhete que encontrou por acidente; sentiu que não fazia mais parte daquilo. Teve vontade de correr, sair de lá, mas terminou seguindo-o até o quarto, onde se abraçaram. Mais uma vez, foi lembrada de porque o amava; o conforto do abraço, o ebulir do sangue, um suspiro. Olhou a gaveta. Gaveta, bilhete. Sim, o bilhete. "Você também está se tornando importante prá mim." Também, importante. "Somos o casal do milênio." Casal. Também, importante, casal. Casal, também, importante. Uma dor aguda apertou-lhe o peito. Sabia que não podia cobrá-lo por nada. Sabia que não podia impedí-lo de nada. Nada. Nada era sua condição.


Chorou o choro da impotência e o apertou até sentir que seus braços não conseguiam mais. Ela não conseguia mais. Ela não podia mais nada. Nada. Mas barganhou, apostou na declaração do carinho e da atração que sentia por ele. Teve, então, o rosto segurado por duas mão frias e ouviu: "Eu seria louco se voltasse prá você agora." Nada era realmente a sua condição. Existem mais estúpidos na face da Terra que sábios. Também , importante, casal. Também, importante. Também sou importante. Recolheu sua bolsa, Crime e Castigo já estava debaixo do braço. Disse adeus. Ouviu: "Me ligue quando quiser." Buscou a porta. Sentiu por dentro que aquele seria o último encontro. Olhou para trás. Os pés estavam presos ao chão. Não conseguia jogar fora o que sentia. Existem mais estúpidos na face da Terra que sábios. Sim, precisava ser estúpida. É preciso ser estúpido para tornar-se sábio. Chorou e olhou a capa do livro. Ouviu: "Volte sempre. Sabe que tenho muito carinho por você." Carinho? Volte sempre? É, quem te ama vai te magoar. Crime e Castigo. Pensou mais uma vez na sua condição. Nada. Alcançou a saída do prédio. Chovia. E rumo ao nada seguiu.

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