domingo, 14 de agosto de 2011

Sobre o masculino

Lá estava eu a ter minha paciência testada com todas as declarações sobre o dia dos pais... Mais um ano em que sou bombardeada com toda a propaganda, as mensagens, o blá-blá-blá sobre os heróis da casa, etc e tal. Tudo isso continua a me fazer mal e a me desgastar. Fujo o quanto posso dessa coisa toda, mas o Universo curte dar aquela torturadinha na minha pessoa...


Bianca: "Oi, boa tarde. Eu quero levar essa sombra. Quanto custa?"
Vendedora: "Oi! Ah! Ela tá em promoção! O preço está ótimo! Só 39,90."
Bianca: "Tá bom. Vou levar."
Vendedora: "Por que você não aproveita e leva também o lápis? Tudo para os olhos está em promoção!"
Bianca (querendo resolver tudo o mais rápido que pudesse pra poder sair do maldito shopping): "Não, obrigada. Eu quero somente a sombra."
Vendedora: "E o presente pro seu pai? Você já comprou? Aproveita! A gente tem..."
Bianca (cortando a vendedora): "Obrigada, mas meu pai já faleceu."
Vendedora (insistente e sem noção): "E pro seu marido?"


Bom, não vou me prolongar contando o resto da cena... Aqueles que me conhecem já sabem a cara que eu fiz e que estava a um passo de deixar a mulher falando sozinha. Bom, vou abrir um parêntese aqui pra fazer um comentário sobre um assunto, que não será o tema deste post: o intrometimento de certos vendedores. Cara, alguns deles não têm uma gota de desconfiômetro! Se uma pessoa diz que vai levar somente uma coisa, deixe-a levar aquilo que foi buscar. E mais: "seu marido?!" E se eu fosse lésbica?! E se fosse viúva?! Alguém tem que colocar um freio nessa indiscrição-em-nome-dos-lucros! E fecho o parêntese!

Como já disse, o ponto deste post aqui não é a indiscrição dos vendedores, mas minha reflexão sobre mais um dia dos pais sem o meu pai. A gente até cria um certo calo por conta da vida, e eu, pelo menos, sempre acabo refletindo sobre a falta do meu pai.

Neste ano, acabei, por acaso, assistindo a um episódio da segunda temporada de Mad Men, em que Don Draper, numa conversa com seu filhinho, fala sobre não ter mais seu pai. Daí, o pequeno responde: "We have to find you a new Dad!" (Nós temos que achar um novo pai pra você!). (Mais uma torturadinha do Universo, bem no Dia dos Pais!)

Well, comecei a pensar nisso, no fato de encontrar um "new Dad"... E pensei, também, na ausência de figuras masculinas ao longo da minha vida: meu avô materno faleceu 7 meses antes de eu nascer; meu avô paterno saiu de casa e não queria netas, só netos; meu pai faleceu quando eu tinha 16 anos. Gente, sempre fiquei cercada por um universo de mulheres: mãe, duas irmãs, duas avós batalhadoras, mais de 10 tias. (Isso sem falar das minhas roommates...) Na minha casa, não tínhamos um garoto que fizesse as coisas, não tínhamos um rapaz que chamasse o garçom, não tínhamos um homem que cuidasse do carro. Éramos meninas que tinham de fazer de tudo. 

Depois de reconhecer o inevitável, comecei a pensar no quão masculina eu me tornei ao longo desses anos... Não quero que vocês entendam que eu falo grosso, só tenho calças no meu armário ou, ainda, tenha uma queda por garotas. O que eu quero dizer é que comecei a ficar cada vez mais pró-ativa, tomando a iniciativa de fazer as coisas, consertando o chuveiro, usando a furadeira, chamando o garçom (mesmo acompanhada de 'um homem'), negociando assentos no cinema, entendendo como funciona um carro, sendo menos sentimental e mais prática nos meus relacionamentos... 

Acho que ao invés de achar um "new Dad", me aproximei de várias figuras masculinas e decidi aprender com elas, decidi fazer por mim o que não pude conseguir a partir do meu pai, dada a sua ausência forçada. Eu tive sete namorados, gente! (Minha pesquisa de campo foi incrível!) Quando comparo a Bianca que eu era aos 16 anos, sempre boba e romântica, com aquela que sou hoje, fico um tanto surpresa. E começo a pensar que a ausência física do meu pai não foi tão prejudicial assim.

Sei que, ao ler esta minha declaração aqui, muita gente vai achar que sou insensível. Não me importo com isso. O que me importa é que eu tenho uma história linda pra contar sobre o pai mais maravilhoso do mundo, que cuidou sempre de mim e que, se ausentando, me deu a enorme chance de crescer e ser a mulher-meio-homenzinho que sou hoje. A ele, a minha gratidão... e meu manifesto de sempre-saudade.


4 comentários:

  1. Blanche,
    sei que você já deve ter cansado de ler/ouvir "sinto muito", mas ainda assim, mesmo com alguns anos de atraso, fica o meu sinto muito. A gente já se conhece há um tempo legal, mas nunca soube. Acho que é uma coisa minha: se um amigo meu nunca fala dos pais, não toco no assunto porque tenho a tendência de pensar que pode ser ferida aberta. Entende?
    Sobre a indiscrição dos atendentes, concordo muitíssimo contigo. Ontem fui a uma loja comprar uma bermuda pro meu pai. Tudo bem que já era pra ele mesmo, mas e se eu não tivesse mais pai? E se tivesse e ele fosse um maldito filho da puta pra quem eu não quero nem olhar? (Não é o caso. Eu amo meu pai e tenho a sorte de ainda tê-lo ao lado. Está um garoto de 65 anos!)
    Sobre você: eu admiro gente forte, com garra. Brava gente mesmo, sabe? Há que se aprender de um tudo num mundo cada vez mais "cada um por si", ainda que se tenha o outro com quem contar. Penso dessa forma. Companheirismo é maravilhoso, mas esse companheirismo não pode ser motivo de dependência do outro. Por isso, parabéns por ser quem você é, minha flor. Você é o que é. E o é da melhor maneira que consegue ser. Tente não ficar triste hoje. Eu não acredito no que vou escrever agora, mas penso que deve ser uma espécie de alento pra quem tem uma crença. Então se você tem uma, serve pra ti: teu pai te ama e vigia por você o tempo todo. Segue em frente porque ele certamente tem orgulho da filha que tem.
    Um beijo do teu amigo!
    Te adoro, flor!

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  2. Bela reflexão Bianca. Sempre carregamos com a gente aqueles que amamos.

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  3. Querido Marcelo! É sempre muito bom ter sua presença ilustre por aqui! ;)
    Eu entendo quem não me pergunta sobre o meu pai. Aliás, eu admiro quem não me coloca na posição de ter que ficar repetindo que ele já é falecido. Isso facilita as coisas e me deixa livre para passar pela situação de admitir isso em voz alta quando eu quiser, não quando o mundo quer. Obrigada!
    Quando à dependência dos outros, ela aparece devagarzinho, de mansinho e, quando você pára pra pensar, já está no esquema: existe uma pessoa que faz todas aquelas coisas por você. Isso é confortável e facilita a vida. Daí, você só sai da zona de conforto depois de ser privado da presença daquele faz-tudo na sua vida. É phoda, meu amigo.
    Obrigada pelos parabéns. Acho que consegui fazer caipirinha com os limões da vida. Mas ainda não consegui me embriagar. A tristeza habita em mim algumas vezes ao longo dos anos. É inevitável.
    Beijo gigante! Também adoro você!

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  4. Olavo! Presença ilustre! Bom saber que você passa por aqui! ;) Obrigada!
    Bom, nós somos esse imenso museu de memórias, né?! Como já dizia uma pessoa que não me lembro o nome agora, "uma pessoa só morre depois que morre a sua testemunha".
    Beijo no coração!

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